Seus sonhos estão vivos?
Quando deixamos nossos sonhos no fundo do baú, eles não somem. Ficam lá, nos aguardando.
Por esses dias consegui me redimir do que agora considero um pecado artístico e assisti o filme As pontes de Madison (1995), dirigido por Clint Eastwood - também intérprete do personagem principal. Me preparei, no entanto, para o que dizia a sinopse do Google: história de amor comovente sobre um fotógrafo da revista National Geographic, incumbido de fotografar as pontes de Madison, em Iowa. Lá, ele conhece uma dona de casa, cujo marido e filhos estão viajando. Os dois vivem um breve e intenso romance. Minha versão, depois da experiência, seria um pouco diferente:
"O roteiro foi inspirado em um livro de mesmo nome e retrata a história de Francesca, personagem de Meryl Streep, uma mulher italiana casada com um americano, dona de casa e moradora de uma fazenda bem no fim do mundo do Iowa, nos Estados Unidos. Numa semana qualquer, a família - filhos e marido - viaja para participar de uma feira e ela fica sozinha com seus pensamentos sobre aquela vida tediosa. Eis que no primeiro dia dessa folga, chega na cidade Robert, um fotógrafo da National Geographic, em busca das pontes cobertas locais. Ela o ajuda e eles vivem um romance, de fato, intenso."
Imagino que o filme tenha causado um burburinho nas conversas conservadoras daqueles tempos dos quais estranhamente (?) há quem esteja tentando voltar. O casal, afinal, é o símbolo do rompimento com o tradicional caso extraconjugal de maridos retratados no cinema. É ela, a dona de casa, que carrega o enredo com seu sentimento de perda. De si, do mundo lá fora, de autoestima, de sonhos, de tudo que não viveu.
"É uma vida rala, vivida pelo que não é e não pelo que é. Se você está sempre tentando fazer da sua vida o que você quer que seja, você não está realmente vivendo a vida que você tem.”, The Economist. Este trecho foi retirado da newsletter “O desapego X a saudade dos textos”, da
A vida está passando
Recentemente, sem escândalos de traição, a supermodelo brasileira Gisele Bündchen se separou do jogador de futebol americano Tom Brady com quem estava há mais de 10 anos. Gisele, segundo a própria já declarou, não estava satisfeita com o casamento porque ele nunca cumpria a promessa de se aposentar do esporte, considerado violento, e ainda mentiu para ela sobre a última negociação com seu time atual. Tem relatos dela sobre o pacto e as expectativas nas páginas do seu livro autobiográfico Aprendizados (2018).
A modelo tinha casa, o chamado bom marido, filhos, trabalho, uma bela quantia em dinheiro. Em termos financeiros e de carreira, bem diferente de Francesca e inúmeras mulheres de poucas décadas atrás. Há quem questione: queria mais o que? Por isso e outras coisas, é difícil bancar os próprios desejos, afinal a partir do momento em que você verbalizar sua vontade, vai chover julgamentos e cobranças na sua horta.
Desejar uma vida viva - a presença e parceria de quem você ama, viajar, exercer seu talento para além das paredes da casa, prosperar - soa como se esse mínimo para a felicidade de qualquer um fosse um máximo. Não que vá existir perfeição e que todas essas arestas irão funcionar ao mesmo tempo. A maturidade nos ensina a entender as ondas e tudo bem. Mas, não é sobre isso. É sobre a invisibilidade e os sonhos e desejos que vamos anulando em prol do que é esperado de nós.
Eu mesma desejo tudo isso e um dos meus maiores medos é me sentir como Francesca porque, revelo aqui, já me senti e foi uma dor terrível. Na época, repetia "sinto que a vida está passando pela janela como um bloco de carnaval e não estou participando da festa". E eu só vivi isso porque naquele momento fui mais uma mulher que se apagou para despender energia para um relacionamento que sequer valia a pena.
Apesar de tanto o filme quanto minha história envolver terceiros - parceiros, família, amigos -, quero ressaltar aqui que a escolha é individual. Com muitas influências - renda, crenças, doenças, medos -, mas ainda assim é nossa. Falo isso não para gerar culpa, pelo contrário. A ideia é mostrar que se temos o poder em mãos, também temos como recomeçar. Esta é a razão deste texto estar na sessão "Para se cuidar".
“De Long Island ao Vale do Silício, o medo de ser visto como fraco obriga o homem a fingir que nunca fica com medo nem se sente solitário, confuso, vulnerável ou errado; e o medo extremo de ser vista como fria, imperfeita, difícil de agradar ou hostil força a mulher a fingir que nunca fica exausta, não tem ambições e nunca se irrita ou sequer sente fome.”, escreve Brené Brown no livro Mais forte do que nunca sobre os americanos, mas poderia ser sobre nós ou qualquer pessoa do mundo. Pensando nos outros, deixamos de viver.
Se você anda sentindo o marasmo por aí, lembre-se que por mais lindo que seja, o filme é só o filme. Não resolvemos nossos sonhos encontrando um novo amor. Quando a tal relação ruim acabou, me fiz duas promessas. Uma era não deixar minhas escolhas me levarem a me sentir invisível. Sigo buscando isso e posso dizer que de tédio não morro. A outra foi ficar sozinha, romanticamente, ao menos um ano, precisava me reencontrar, saber quem eu era, o que queria, o que sonhava. Por razões misteriosas do destino, cumpri milimetricamente. O primeiro encontro com meu então marido, foi, acredite, um ano depois daquele fim.
A escrita de hoje foi para que, independente da sua idade, você saiba que ainda há tempo. Que cuidar de você é, antes de tudo, encontrar-se consigo mesmo, se permitir sonhar e ter coragem para voar. A vida está mesmo passando e nós queremos mais.
Links legais para seu autocuidado:
O filme, claro. As pontes de Madison está disponível em diversos streamings, assisti no HBO. Acrescento aqui que tem uma cena dela no espelho se olhando, nua, tão cheia de camadas sobre se reconhecer. Lindo demais, assistam!
Este post diz tudo:
Às vezes a capacidade de sonhar é afetada pela capacidade de sentir prazer, sabia? É possível recuperar a vivacidade através de um momento seu para conhecer seu corpo. Aprenda mais sobre o toque e masturbação neste link da Claudia online.
"Quando você vir uma mulher priorizando a si mesma, não julgue, parabenize.", Manuela Dias, neste post:
O livro que lemos em novembro no clube do livro (mês que vem reabro as assinaturas com novidades), foi o Mais forte do que nunca, da Brené Brown. É uma ótima leitura para quem está na fase de recomeçar, precisando voltar a acreditar em si e na vida, e também para quem está buscando coragem para ir em busca dos sonhos.
Esta dica não está em link algum, é só uma pergunta para você refletir neste fim de ano: você tem fome de que? Me perguntei isso em meados de abril deste ano, uma das respostas é esta newsletter.
Desejo uma semana com coragem por aí, não basta sonhar, tá? Vamos realizar! Falar nisso, aguardem novidades em dezembro, dia 08 tem lançamento :)
Um abraço,
Gabi
Amiga, desculpe a demora para comentar. Eu amei tanto essa tua news que fiquei sei nem saber o que responder. Queria comentar todas as referências e ideias, além de te sugerir umas mil coisas que dialogam com o que você falou. Enfim, como não dá para eu passar duas horas comentando tudo isso contigo, eu só queria dizer que amei tudo e que vamos deixar nossos sonhos bem vivos para continuarmos sempre trabalhando por eles. Beijos!
Assisti a este filme no cinema 👵🏻 e puxando pela memória a única lembrança que tinha era a de ter achado chatérrimo. Só agora, lendo seu texto e a sinopse, me dei conta de que uma menina de 18/19 anos jamais alcançaria esta mensagem na época - vou tratar de reassisti-lo!