Tempo para você

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Livre como um carnaval

gabialbuquerque.substack.com

Livre como um carnaval

Seria bom esse sentimento o ano inteiro, esse que nos liberta para ser e ousar sem medo do julgamento (dos outros e do nosso).

Gabi Albuquerque
Mar 6
13
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Livre como um carnaval

gabialbuquerque.substack.com

O que queria para hoje era um tal de Carnaval. Não pelo frevo ou pela festa, mas pela liberdade que só ele tem. É nesse tempo de rua, de sorrisos e cores, que a gente usa de fato o que quer, protesta com memes engraçados sem ser com o rosto escondido pela tela do celular, abre o coração para o imprevisível, dança com o corpo solto e até reclama menos. 

Não sejamos sonsos, em outras datas não somos os mesmos. Pensamos três vezes quando cogitamos vestir algo diferente. Ou falar o que não é esperado de nós. Já quando chega a folia do Momo toda roupa é roupa com a desculpa da fantasia. Você coloca pra fora todas as suas loucuras, sobe e desce as ladeiras, pula como se não houvesse amanhã, ri de vários perrengues, gruda no confete e na serpentina e suja o cabelo de espuma porque, oras, é Carnaval.

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O olhar das outras pessoas pessoas sobre nós muda e vice versa. Quando sua maquiagem está vermelha demais, ninguém te julga. A saia curta é bobeira, a blusa com estampa de bicho não é brega, o sutiã aparecendo é uma graça.

“Vai menina, vai menino, esquece o mundo e usa o que tu quiser.” Devia ser o hino da festa, boa frase para uma marchinha.

Se hoje fosse Carnaval veríamos as mulheres de calça justa, decote generoso e nem aí para o tamanho das suas barrigas e acharíamos belíssimo - e não corajoso ou sedutor demais - assim como quando estamos no baile do I love cafusú (menção honrosa a esta festa que ocorria no Recife no início dos anos 2010) ou qualquer festinha brega hype. E não, ainda não somos livres a este ponto e ainda julgamos muito. Mesmo sendo feminista, verdade seja dita, nos diferenciamos de outras através do que vemos como ruim, seja isso uma roupa conservadora ou não. 

Por essas e outras, todo mundo ficaria mais feliz se fosse Carnaval todo dia; a gente tiraria as amarras, os conceitos e preconceitos, o certo e errado, o veredicto. Não seria muito mais bonito?! O fim da alegria contida, da vergonha e do “deixa pra lá, vou usar bege”. Aliás, tem coisa mais sem graça que usar sempre bege? Quantas pessoas "nude" não devem pensar em variar a cor e desistem porque não é dia de bloco? 

Foto: EuTbm

Talvez a solução deste país seja ser Carnaval para sempre. Se a gente consegue essas proezas da liberdade de ser em uma determinada semana de fevereiro, às vezes março, me soa como se já tivéssemos encontrado a saída. Se decreta um estado de sítio ao contrário e sem previsão de fim. Quem não é de rua, não seria obrigado obviamente. A festa carnavalesca tem o dom, além de todo o resto citado, de espalhar uma vibração única e bate mesmo nos que estão sentados em uma poltrona assistindo um filme de Sofia Coppola. 

Nem que seja pelo menos por mais um dia, fica mais um pouco, Carnaval.

prefeiturarecife
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Nota da autora: este texto foi publicado originalmente em fevereiro de 2012, quando eu escrevia sobre moda e comportamento {o que não deixa de ser um pouco do que faço hoje também}. Lembrei dele, repaginei com referências mais atuais e outros tributos. Deixei alguns trechos que são típicos do Carnaval de Recife e Olinda, claramente minha saudade doída de fevereiro. Esses apegos, eu sei, soam estranho para quem não é daquela terra. É difícil não sentir falta de um lugar que festeja basicamente tudo. Descobri depois de saída, é um lugar que não rejeita a chance de celebrar e esse texto diz muito sobre isso. Carnaval, Natal, Revéillon, São João, início de verão, Páscoa… Não é sobre fuga de trabalho. É sobre saber viver.

A música tinha de ser dançante hoje. “Ela vai dançar a noite inteira, ela vai cantar todas as músicas, pra desfazer, pra desfazer a dor e refazê-la".


Clube Tempo para você

O tema deste mês no clube é liberdade. Combina bem com a crônica de hoje, né? E nem foi de propósito, a palavra está mesmo na minha cabeça. 

Na leitura, vamos ter o livro Eu, Tituba: bruxa negra de Salem, da caribenha Maryse Condé. O livro foi lançado em 1986 e reconta de forma ficcional a história do julgamento das bruxas de Salem, em especial, de Tituba. Uma obra premiadíssima que mostra a coragem da escritora em dar voz às mulheres negras. Isso ainda é raro hoje, imagine naquela época. Maryse ganhou, com o título, o Grande Prêmio da França de literatura feminina no ano de 1986, o Grande Prêmio dos Jovens Leitores, da França, em 1994 e também o New Academy Prize (Prêmio Nobel Alternativo) em 2018. 

O livro é narrado em primeira pessoa por Tituba, uma das mulheres envolvidas nos julgamentos das "bruxas" no século XVII. Ambientada, principalmente, na província americana de Massachussets, em Salem e Boston. Mas também percorre Barbados e a Inglaterra. (aviso de antemão, caso não curta spoiler, pule o prefácio e leia depois!) 

O jornal Boston Sunday Globe, quando o livro saiu em inglês, publicou: "Impressionante... A subversão imaginativa de Maryse Conde dos registros históricos forma uma crítica da sociedade americana contemporânea e seu racismo e sexismo arraigados".

Você pode ler aqui uma resenha apaixonante sobre o livro no perfil Book.ster, do Pedro Pacífico (por sinal, ótimo para seguir e saber dicas de leituras diversas): 

book.ster
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O filme será o belíssimo Gloria Bell (2019), com a atriz Julianne Moore. Mesmo que você nunca tenha passado por um divórcio, com certeza vai se identificar com Gloria em alguma cena. Ela é uma mulher comum que vive a angústia de cuidar de todo mundo, em um cotidiano padrão, lidando com problemas dos filhos e conhecidos, e está separada há uma década. Mas, não fica por aí. A personagem surpreende. Ama dançar e vai sozinha para as baladas de Los Angeles, onde mora, apenas para se soltar na pista. Sabe viver.

O enredo tem Gloria tentando se reencontrar, amando de novo e onde isso vai dar quando se é uma mulher adulta com a vida meio organizada. Vale muito ver e se inspirar. 

A produção é uma refilmagem de um filme chileno chamado Gloria (2013). A atriz Julianne Moore assistiu por causa de uma recomendação de terceiros e quis fazer uma versão já que o papel principal era de uma mulher de meia idade, perfeito para ela e raridade nos estúdios americanos, conhecidos por escantear as atrizes quando completam determinada idade. Seja em qual versão for, é vibrante e inspirador. 

Foto: Volkskrant

Os assinantes premium participam do clube e da conversa, ao vivo, através do Zoom, e recebem um e-mail caprichado no dia do encontro com uma pesquisa sobre o tema e as obras, relacionando os fatos, além de links para o que achei interessante. Nosso encontro de março será dia 26/03, às 16h. Quer participar? Basta fazer o upgrade da assinatura! Nosso grupo é divertido, com gente fina e elegante haha. 

"Ler livros de ficção aumenta a empatia e a inteligência emocional e que de acordo com estudos recentes, pessoas que lêem romances têm uma visão de mundo mais complexa", trecho do artigo "Why we should all be reading more fiction" {Por que nós deveríamos estar lendo mais ficção}, do Financial Times 


Daqui a pouco é o Dia Internacional da Mulher (08/03) e o tema de março ser liberdade na ficção - não tão ficção assim - de duas mulheres não foi à toa. Para ler mais sobre o que penso do feminismo, de ser mulher e das nossas questões, indico estas publicações:

Tempo para você
Seus sonhos estão vivos?
Por esses dias consegui me redimir do que agora considero um pecado artístico e assisti o filme As pontes de Madison (1995), dirigido por Clint Eastwood - também intérprete do personagem principal. M…
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4 months ago · 17 likes · 12 comments · Gabi Albuquerque
Tempo para você
É possível ser feminina e feminista?
Quando eu tinha em torno de 10 anos de idade, tivemos uma babá que claramente sofria agressões do seu então marido. Lúcia* chegava a ter marcas arroxeadas no corpo e às vezes faltava sem explicação. …
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5 months ago · 11 likes · 4 comments · Gabi Albuquerque
Tempo para você
Quem não desiste nunca é mulher
Semana passada, após um encontro com uma amiga, peguei um uber para voltar para casa. Era noite. Mas, não tanto. Metade do trajeto foi em paz e outra metade foi com o corpo tremendo. O motorista erro…
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6 months ago · 11 likes · 8 comments · Gabi Albuquerque

Certamente, postarei sobre o dia no Instagram. Sigam aqui, caso queiram me acompanhar.


Uma semana sem julgamentos para nós, nem sobre a gente nem sobre os outros. Mulheres, queridas, vocês são maioria aqui, agradeço imensamente o apoio e a troca.

Um beijo, 

Gabi

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6 Comments
Paula Maria
Writes te escrevo cartas
Mar 8Liked by Gabi Albuquerque

Que o brilho dos paetes possa alegrar nossos dias comuns como no Carnaval. Vamos nos vestir e nos comportar parar viver a festa possível. Beijo

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1 reply by Gabi Albuquerque
Giuliana Giordano
Writes devaneios & outras loucuras
Mar 6Liked by Gabi Albuquerque

Tudo tão tão verdade.... e tão atual, mesmo 10 anos depois da data do seu texto original...

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1 reply by Gabi Albuquerque
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