Errante, forasteira, nômade

as descobertas de quem muda as suas geografias

mai 20, 2024

Sinto que estou cada vez mais nômade. Menos apegada. Casei com um aquariano que sempre alegou não ter favoritismo sobre cidades. Custei a acreditar. Não era possível, pensava. Pois bem, eu, uma taurina convicta, cheia de raízes fincadas dentro do peito, agora me sinto mais do mundo, de múltiplos pontinhos no mapa.

Me imagino arrumando as malas e partindo para o próximo destino. Nem sei se isso irá acontecer e se não, talvez eu sofra o contrário do que imaginava. Ficar pode passar a doer. Ainda detesto a chegada no lugar novo, encontrar novos médicos, novos mercados, nova academia, entender as hortaliças locais e ainda o movimento de conhecer gente nova. Gosto da parte dos amigos novos, mas o processo me exige tanto. Ainda assim, meu corpo dá sinais de que tudo bem ser forasteira. Nos titulei muitas vezes como forasteiros, era uma piada. Se tornou real.

Não sei ao certo se isso é realmente estranho a minha persona ou se é novidade apenas para a Gabriella adulta. Lembro do meu eu mais jovem, até uns 20 anos, com o ímpeto de pegar a bagagem e partir. Quando escolhi o jornalismo, no fundo estava um desejo de ir embora daquele lugar que soava pequeno demais para meus sonhos. Peguei o livro Comer, rezar, amar, da americana Elizabeth Gilbert, anos atrás, aos 17 ou 18 anos, com o pé atrás porque já tinha uma certa impaciência para best sellers, e terminei a leitura não só fã do título como querendo embarcar para a Índia e fazer yoga. Já realizei a parte yogue.

Londres, 2011. Uma eu de cabelo alisado *risos*

Viajei sozinha aos 23. A razão foi tão clichê quanto um best seller razoável, decidi fazer as malas depois de um pé na bunda com direito a muitas lágrimas e promessas feitas a minha própria existência. Passei um mês e meio descobrindo a delícia do frio na barriga de chegar em outro território apenas comigo mesma. Depois disso, foram muitas idas a sp sozinha, quase como refúgio. Mesmo acumulando essas experiências boas, são sei porque cargas d'água, perto dos 30, fiquei melindrada de ir embora.

No fim das contas fui com medo mesmo, aos 33.

Após uns meses de reconhecimento de si em outra configuração no novo endereço (e isso doeu à beça), voltou a ser divertido ser alguém desbravando um lugar. Aprender novos jeitos de viver. Ter umas raivas novas, sabe? Rir diferente. Às vezes o novo território não conecta com a gente de forma rápida, mas, uma hora encaixa mesmo que não seja perfeito.

Outro dia, já no segundo novo endereço, fui à praia em uma segunda-feira, encontrei uma amiga nova, pedi um coco e vimos o pôr do sol. Me soltei e em outra ocasião usei 40 minutos da manhã para ir a beira mar renovar a vitamina D enquanto gastava as pernas na areia fofa. Compro ingressos de teatro mais vezes. Danço na rua porque passa rodas de samba itinerantes. Uso chinelo para tudo e qualquer coisa. É bom. Me divirto. Entrei na onda carioca. Consciente de que o mais provável é que uma hora acabe. Não sei em quanto tempo, nem o próximo destino e nem mesmo se haverá, como já falei. Só sei que tudo é ciclo e decidi aproveitar cada um.

Em São Paulo ficamos um ano e meio. Conheci gente, falei de trabalho, nadei em piscina aquecida, deitei na grama do parque, descobri que tem mil bolhas e é preciso achar a sua se não corre risco de um ser como eu fazer tour de bar. Aprendi muito lá. Sobre quem sou e quem quero ser. Sobre o quanto sou capaz de criar conexão com as pessoas. Sobre coragem. Ganhei casca grossa. Sai sabendo que fiz bastante, mas queria ter feito mais em termos de diversão. Não sei também se era uma questão de match.

Minha única certeza, sentimento raro numa vida meio forasteira, meio boêmia, é que há 36 anos nasci para perambular.

Queridos leitores, embarquei de férias no dia do meu aniversário, ontem (19/05), sem meu computador. Ousada! Aviso que este e os próximos dois envios são inéditos, mas foram programados antecipadamente. A Tempo para você não está off, portanto. Lembrando que o da semana que vem é exclusivo para assinantes premium!

Voltamos ao padrão em junho e se você mandou e-mail, respondo a partir de 31/05.

Uma semana tão feliz quanto a de uma pessoa que ama fazer aniversário.

Um beijo,

Gabi