Há alguns anos comprei um livro chamado Mulheres, comida e Deus, um achado, só disponível em sebos, sobre nossa relação com a comida e nossas emoções. A autora, Geneen Roth, precisa explicar logo nas primeiras páginas o que significa para ela o Deus do título. "Eu me voltei para a comida pelas mesmas razões que muitas pessoas se voltam para Deus: era a possibilidade de suspirar em êxtase, sentir-me no céu…", revela e, ao final, complementa: "entender a relação com a comida é um caminho direto para voltar para casa depois de anos de exílio. Talvez essa casa seja o verdadeiro significado de Deus".
Outra autora que adentra no assunto Deus nas suas páginas é a Elizabeth Gilbert. No já clássico Comer, rezar, amar, Liz conta sua própria história após um divórcio traumático e o caminho de se reencontrar. Essa travessia, como ela mesma gosta de chamar, envolveu meditação, ashram (local, na Índia, onde as pessoas se recolhem para encontrar paz interior), guru e Deus. Um dos trechos mais marcantes para mim é quando ela fala "Deus vive dentro de mim, como eu" em um momento de clareza sobre suas próprias características, antes vistas como defeitos.
Julia Roberts dando vida a Liz no filme Comer, rezar, amar. Cena do ashram
São apenas dois exemplos de tantos sobre o quanto Deus é complexo no nosso mundo, nas nossas conversas e até na arte. Desde o Iluminismo, aquele momento de ruptura histórica com um ocidente dominado pela religião Católica e punição para a ciência, nos tornamos mais e mais racionais e neste contexto parece não haver espaço para Deus algum. O rompimento foi justo e necessário, longe de mim defender gente queimada por suas descobertas, mas a gente precisa mesmo estar apenas no ceticismo para avançar?
Eu mesma, aos poucos e sem notar, fui me distanciando da minha espiritualidade, afinal eu defendo vacina, ciência e pesquisa. Sou a rainha do "segundo dados…". O que sinto é que quando a palavra Deus está na ponta da minha língua, a travo. Especialmente em São Paulo, a cidade do trabalho e da praticidade, parece não ser de bom tom e a fé ganha ares de misticismo - com tom pejorativo.
Só que eu também sou a criança que sonhou com Deus. Eu tinha 5 ou 6 anos e no meu sonho a gente conversava e ele, cujo rosto no sonho, na verdade, era de Jesus (personalização que a criança encontrou), me ajudava a separar roupas para doar. Coincidência ou não, dificilmente passo mais de 2 meses sem doar nada até hoje.
Percebi esse meu afastamento da fé ao final de uma meditação cuja base era o alinhamento de chakras (prova de que enxergo fé em todas as linhas). Com vergonha de falar em Deus, me desconectei de uma parte minha e essa parte é tão essencial em mim quanto a que busca provas científicas sobre tudo e qualquer coisa. Espiritualidade é uma das minhas forças de caráter (bases de sustentação, em resumo bem resumo) e me ajuda a aplacar a ansiedade e o controle.
Amo essa foto flagra, no meio da grandiosidade de Jericoacoara, porque nesta hora eu estava pensando: Se eu quiser falar com Deus tenho que ficar a sós tenho que apagar a luz tenho que calar a voz
Sou a adulta que buscou caminhos para ter um corpo e mente com saúde, para se cuidar, através do que considero Deus. Sou uma viajante que quando chega em lugares belíssimos e naturais pensa: como usar outro adjetivo senão divino? Sou a que se curva a Iemanjá sempre que entra no mar. A que gostaria de aprender mais sobre os orixás. Respondo Graças a Deus para coisas que deram certo e de fato o agradeço. Quando amigos e familiares passam por desafios, eu rezo por eles. Lembro até hoje da minha emoção ao ouvir uma música católica que aprendi na escola de igual religião: o mundo pode até fazer você chorar Mas Deus te quer sorrindo. Está salva no meu Spotify.
O Deus que acredito não é punitivo e nem de uma igreja só. É uma presença sem tamanho. Tem todas as cores e credos. Abraça todos os continentes e mares. É dos santos e dos orixás. É da reza e do mantra. Embala todos os gêneros e preferências sexuais. Ele é casa, como disse Geneen, e é, portanto, como nós somos, como disse Liz.
“Um homem consola-se das pessoas que perde, mas se falta eu mesmo, essa lacuna é tudo”, Dom Casmurro.
Sendo eu parte racional e parte espiritual, reencontro aqui, e nos meus contornos, minha inteireza e sem lacunas.
Hoje escrevi mais além das dicas porque o assunto Deus me surgiu e, como já citei, está envolvido no meu autocuidado e pode ser que te ajude a refletir sobre o seu. Neste mesmo assunto, cheguei no episódio Espiritualidade, transcendência e o Sagrado do Podcast Para dar nome às coisas (isso, mais uma vez ele aqui) quando a Natália busca seu caminho de fé. Não repetiria a dica, mas foi uma coincidência muito louca porque conversei sobre o insight da minha fé com meu marido numa noite e na manhã seguinte estava lá na home do Spotify. Como ignorar?
Para além dos meus devaneios… Jana Rosa, criadora do Bonita de pele, escreveu um depoimento fantástico - e totalmente alinhado com o que refletimos este mês (aqui!) - sobre sua decisão de parar de consumir álcool e como está sendo a experiência. Consumo bebida socialmente e adoro o sabor do vinho, aprecio de verdade, mas odeio a sensação de estar fora de mim e por isso nunca passo de duas taças ou dois drinks e evito fazer isso nos dias de semana e em todos os dias do fim de semana. Assim como não curto em mim, tenho pouca tolerância também a pessoas bêbadas, é meu limite (o que não está necessariamente correto). O que você pensa sobre isso? Sabe sua quantidade "ideal"? O álcool é um vilão?
Indo para um assunto que até tem relação com álcool porque muita gente usa para aplacar a timidez e se jogar num mundo extrovertido, li essa matéria sobre a quantidade ideal de amigos e me senti abraçada. Meu casamento contou com 30 convidados e nosso chá tinha em torno de 70 pessoas e isso diz muito. haha Mas, a matéria não fala só dos introvertidos, é um apanhado sobre intimidade e quantos laços precisamos para nos sentirmos felizes.
Por fim, deixo aqui esse texto da Tati com dicas literais sobre hábitos e estresse. "…passei a mapear tudo que me gerava irritação, tristeza e ansiedade. Tudo aquilo que causava insatisfação de forma tão gritante, que era até verbalizado.", nesse trecho ela comenta que andava reclamando de tudo, estava a flor da pele, e isso a fez perceber que algo estava errado. Quem nunca, né? Acho uma ótima ideia conferir toda a newsletter dela que se chama Táticas de bem viver e tem partilhas para encontrar caminhos de autocuidado.
Balanço do mês
Como este mês tem 5 segundas, o balanço virá na próxima edição acompanhado de um especial sobre Dinheiro.
Um beijo e uma dose de fé no que você quiser acreditar,
Gabi
Eu sempre sinto uma conexão muito grande com Deus quando estou ao ar livre, principlamente praia e floresta, é uma conexão inexplicável que nunca consegui sentir dentro da igreja.
Muito interessante! Tenho pensado sobre isso também devido à proximidade do batizado do meu filho, além de também me emocionar bastante com a música mencionada. Adoro ouvi-la nos momentos difíceis para juntar forças dentro de mim, bem como a Oração de São Francisco, neste caso para me acalmar.